outrO empréstimo consignado pode ser tratado também na matéria de direito do consumidor, pois se trata de uma verdadeira relação de consumo. Prefiro tratar dele aqui, no tema dos contratos. Afinal, é uma contratação muito comum e regulada por normas especiais, não só aquelas análogas do Código Civil.
Tema muito comum entre os aposentados, justamente por se tratar de um auxílio no complemento do benefício, seja para aquisição de bens de consumo, seja, geralmente, para quitação de dívidas.
O normativo original é a Instrução Normativa INSS/PRES nº 28, de 16/05/2008, alterada pela Resolução MPS/CNPS nº 1.302, de 27/08/2008, e por diversas outras instruções normativas (IN INSS/PRES), sendo a última delas a de nº 81, de 18/09/2015.
Essa espécie de contratação é mais complexa do que se imagina, porém, vou abordar apenas os temas que mais interessam à discussão jurídica e judicial da matéria e são pertinentes ao próprio beneficiário, que, na grande maioria, desconhece tais pontos.
O empréstimo consignado (empréstimo pessoal), bem como o cartão de crédito, que são operações concedidas pelas instituições financeiras, são descontados diretamente do benefício pago pelo INSS (art. 1º e 10, IN INSS/PRES nº28/2008), observadas algumas regras básicas, como o próprio normativo cita. A princípio, são elas:
- o empréstimo deve ser realizado com instituição financeira que tenha celebrado convênio com o INSS;
- contrato assinado pelo tomador com apresentação de documento de identificação e CPF, mais;
- autorização de desconto expressa por escrito ou por meio eletrônico, e em caráter irrevogável e irretratável. Aqui, dois pontos: um, a apresentação do contrato ao convênio do INSS certamente é feita após o prazo de rejeição de que trata o artigo 49, do Código de Defesa do Consumidor, que é de 7 (sete) dias; e, o mais interessante, é que a autorização de desconto não pode ser por telefone, nem por gravação de voz (inciso III, artigo 3º, introduzido pela IN INSS/PRES nº 39, de 18/06/2009.
Esse benefício pode ser: aposentadoria, de qualquer espécie e pensão por morte (art. 10).
A IN nº 80, de 14/08/2015, aumentou o limite de comprometimento (RMC – Reserva de Margem Consignável) de 30 para 35% (trinta e cinco por cento) do benefício recebido. Desses, 30% (trinta por cento) referem-se ao empréstimo consignado e os 5% (cinco por cento), às operações de cartão de crédito (§1º, art. 10). A margem consignável (35%) é apurada após as deduções obrigatórias (contribuições devidas ao INSS; pagamento de benefícios além do devido; imposto de renda e pensão alimentícia judicial) e as voluntárias (mensalidades de associações e demais entidades de aposentados ou pensionistas.
O número de prestações não poderá exceder a 72 (setenta e dois) parcelas mensais (antes da IN 80, era até 60 (sessenta) parcelas.
As taxas de juros, antes estabelecidas pelo mercado financeiro, foram, também pela IN 80, de 14/08/2015, limitadas a 2,14% ao mês, devendo ainda a instituição financeira expressar o custo efetivo do empréstimo (artigo 13, da IN 28).
Quanto ao cartão de crédito, a taxa de juros é de 3,06% e o limite será equivalente a duas vezes o valor do benefício pago pelo INSS.
Outro tema muito importante, é a transmissão da dívida, no caso do falecimento do tomador do empréstimo.
A Lei 1046/1950, em seu artigo 16, prevê: “Ocorrido o falecimento do consignante, ficará extinta a dívida do empréstimo feito mediante simples garantia da consignação em folha.”
Assim, o que muita gente não sabe é que, se o beneficiário vier a falecer, existindo um empréstimo em vigência, este deverá ser quitado pela instituição financeira – a operação é garantida pelo convênio entre aquela e o INSS -, não podendo mais existir algum desconto consignado no benefício, nem o mesmo ser transferido para o beneficiário que receberá a pensão por morte. Se houver a cobrança, é ilegal, logo, o interessado poderá se socorrer do Poder Judiciário.
Essas são as regras que mais interessam ao usuário dessa espécie de contrato.
Como lançado no título deste tema, algo que pode surgir como alívio, como auxílio num momento difícil, pode se tornar uma grande “dor de cabeça”.
Isto porque, há bancos que acabam “empurrando” diversos empréstimos, geralmente um atrás do outro – o mais novo para quitar o mais velho – o que causará dois efeitos perigosos: o comprometimento do benefício acima do permitido, e o descontrole do que entra (receita) e sai (despesa), chegando até mesmo a casos de não “sobrar” nada do benefício com os descontos relativos aos empréstimos.
E agora vou lhes contar como funciona na prática, porque “na prática a teoria é outra!“.
NA PRÁTICA, A TEORIA É OUTRA!
Pois bem, nem tudo são flores!
Os bancos, nas propostas de empréstimo, elevam o valor do benefício, conseguindo, assim, a aprovação do crédito. Há casos em que os gerentes ainda ganham a fama de ser “bonzinhos”, pois conseguem liberar os créditos, porém, trata-se de pura ilusão, já que esses mesmos gerentes “empurram” outros produtos do banco, que o aposentado nem tem interesse, como seguros de vida, consórcio de moto, títulos de capitalização etc. Ou seja, os aposentados acabam “amarrados” aos consignados, têm sua renda diminuída e, ainda, comprometem-se a pagar por algo que não queriam, em suaves 60 (sessenta) ou em até 72 (setenta e duas) prestações mensais.
Casos comuns também são aqueles nos quais um outro banco entra em contato diretamente com o aposentado (como eles conseguem os nºs dos celulares, dos telefones de casa, por exemplo, ainda é um mistério), oferecendo taxas de juros menores, comprando o consignado assumido com seu banco. Neste momento, apesar da proibição da lei (lembra da IN 80, de 08/2015, que impede a autorização do desconto por telefone ou gravação de voz?), o banco promete que pagará uma diferença significativa, que será creditada em sua conta. Pois é, puro engano!
O banco simplesmente compra aquele empréstimo, assumindo o aposentado o pagamento das novas parcelas que são descontadas do consignado, porém, o número de parcelas é, significativamente, aumentado! Imagine um empréstimo de R$ 10.000,00 em 60 x R$ 562,00, das quais já foram pagas 30 (trinta), faltando, então, a metade. O banco compra essa dívida, mantém o mesmo valor da parcela e lhe dá uma diferença de R$ 4 mil, R$ 5 mil, porém, o contrato volta a ter 60 (sessenta) parcelas daquele mesmo valor!
Como resultado, você fez um novo contrato, que irá se estender por muito tempo e o valor recebido (a diferença) foi inferior ao que receberia se contratasse um novo nas mesmas condições.
Não se pode esquecer que, se um banco bater à sua porta, jamais será para lhe “dar” dinheiro, talvez lhe “tirar”, afinal, não se trata de uma instituição de caridade, mas de crédito, crédito esse que sai caro para pagar.
Por esses exemplos conhecidos, percebe-se que todo cuidado é pouco. Se você vai tomar algum empréstimo consignado, deve ater-se às condições oferecidas. Se for alguma renegociação, mais ainda!
Se for uma vítima de algumas dessas situações ou até mesmo de fraude, que ocorre quando usam seu nome sem você perceber, o que descobre quando já passados alguns meses de desconto do consignado ou de sua própria conta corrente, você deve buscar a ajuda de um advogado que possa representá-lo em juízo e lhe propiciar a aplicação de seu direito, com o retorno das perdas havidas e alguma outra reparação, como a de ordem moral, por exemplo.
Afinal, o que serviria para tais finalidades pode acabar numa “bola de neve”, criada, sobretudo, pela ganância dos bancos, que “empurram” tais empréstimos para cumprir suas metas de ganho fácil, ludibriando aqueles que necessitam de tais recursos, e não pela falta de controle financeiro daquele que tomou dinheiro emprestado.
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